LIBERDADE SOBRAL

Escultura, Odemira

Liberdade Sobral foi uma artista plástica tardia, uma ceramista autodidata a quem é atribuído um cunho popular e naïf. Natural de Ribeira do Seissal de Baixo, no concelho de Odemira, onde nasceu em 1934, nunca frequentou a escola. Levou uma vida dividida entre o trabalho no campo e a lida da casa, invadida de filhos.
Dos sete, nenhum lhe seguiu os passos na arte, mas foi por causa de uma filha que as primeiras obras surgiram, já depois de ter feito 50 anos. Prometeu fazer uma santa, caso a rapariga recuperasse de uma doença grave. Assim aconteceu.
Era o início dos anos 80 e o começo de uma produção criativa arrancada a um mundo imaginário, pejado de bichos, seres híbridos e figuras humanas. Liberdade misturava terra com cimento e dessa massa nasciam leões, peixes, santinhas, pássaros… que pintava de cores vivas e garridas.

Apercebendo-se da sua capacidade criativa, a Câmara de Odemira desafiou-a a construir uma estátua para o jardim público da cidade, mas a sua obra ficou essencialmente conhecida pela participação na FACECO - Feira Económica e Cultural do Concelho de Odemira, que se realiza anualmente em julho. No conjunto, não são muitas as peças que nos deixou, estando a maior parte nas mãos de colecionadores residentes naquela região ou visitantes da feira, frequentemente de férias ou a caminho das mesmas no Algarve.

Em 2001, Município de Odemira quis eternizar-lhe também as palavras com que comunicava a forma poética como sentia o mundo, recolhendo num livro os ditos que costumava dizer. «Vivo num sítio isolado, tratando qualquer flor, ouvindo os passarinhos cantar, que lhes tenho tanto amor». «Eu faço de tudo um pouco, cá dentro da minha lida, não faço nada perfeito porque sou uma mulher antiga».
Liberdade Sobral faleceu em 2020, aos 86 anos.

A HOMENAGEM
Mais recentemente, em março de 2023, a sua memória voltou a ser evocada, numa homenagem que lhe dedicaram na antiga Escola do Monte da Estrada, na Ribeira do Seissal de Baixo.
Na escola onde nunca andou, foram expostas várias das suas obras, pertencentes à coleção particular de uma amiga, que contribuiu grandemente para que Liberdade tivesse o barro e as tintas necessárias à materialização da sua criatividade. No entorno, expressões que usava para se referir ao seu trabalho: «Às vezes, quando acabo de fazer os bonecos, nem parece que fui eu que os fiz.»; «Mas alguém, no seu perfeito juízo, vai dar dinheiro por este entrouxo?»; «Tudo o que eu imaginava de noite com os olhos, fazia, no dia seguinte, com as mãos.»… E, com as palavras e os bichos e seres a que deu forma por cenário, foram lidos poemas e contadas histórias da sua vida.
Num dos episódios partilhados, uma das filhas contou que o 25 de Abril de 1974 encontrou Liberdade na cama, doente, com o rádio por companhia. E que muito a sensibilizou a mensagem de «Viva a Liberdade», muitas vezes repetida nesse dia, por estar convencida de que lhe era dirigida, a pedido dos filhos, para que ouvisse e recuperasse mais rapidamente.

 

Texto de Alexandra Ribeiro Simões, fotografias de Miguel Carneiro.